Links de passagem do livro para 3.2.2 Digital adherence technologies
Diversos produtos de saúde digital estão sendo usados para apoiar diferentes elementos dos programas de TB, como prontuários eletrônicos do paciente, transferência direta de dados de sistemas diagnósticos e módulos de aprendizado eletrônico em aplicativos móveis (24). As tecnologias digitais de apoio à adesão se encaixam no cenário mais amplo das tecnologias da informação e têm como objetivo ajudar a melhorar a comunicação entre os pacientes e os profissionais de saúde (25). Foram estudadas três tecnologias em pacientes com TB que são usadas para apoiar o tratamento em larga escala: serviço de mensagens curtas de texto (SMS, na sigla em inglês); dispositivos de monitoramento de eventos de medicação (MEMS, na sigla em inglês); e tratamento apoiado por vídeo para TB (26, 27).
O SMS é uma função padrão, integrada, em todos os tipos de telefone celular do mundo e, em geral, é barata e fácil de usar. Portanto, é amplamente utilizada para comunicação com pacientes ambulatoriais. O SMS pode fornecer lembretes periódicos e automatizados aos pacientes para que tomem seus medicamentos, pode fornecer informações relacionadas à sua saúde ou quadro clínico (unidirecional) ou ainda oferecer oportunidades de interação (bidirecional). A maioria dos ensaios clínicos randomizados sobre o uso de lembretes por SMS no tratamento da TB, em diferentes contextos geográficos, não conseguiu demonstrar melhores desfechos dos pacientes em comparação com o tratamento padrão. No entanto, os grupos-controle desses ensaios alcançaram altos níveis de adesão por meio de níveis variáveis de apoio presencial. Os resultados também sugerem que o SMS poderia, até certo ponto, apoiar a adesão em algum momento do tratamento no qual o apoio ao tratamento presencial por um profissional de saúde não é possível, aumentando assim a eficiência, e talvez a efetividade. O SMS também pode ser usado quando houver menos necessidade de examinar o paciente pessoalmente, mas ainda for preciso manter contato caso surjam preocupações, como durante a fase de continuação do tratamento ou quando o paciente está em tratamento estável há muito tempo sem problemas. Ainda são necessárias pesquisas que analisem de forma mais criativa como o SMS pode influenciar o comportamento de adesão, indo além dos lembretes para as pessoas sobre tomar seus comprimidos (por exemplo, direcionando transferências de dinheiro quando certas metas de tratamento são alcançadas, combinando lembretes por SMS com outras soluções digitais e abordando outros pontos no itinerário do paciente). A popularidade e o preço acessível do SMS são um argumento convincente para que outros estudos investiguem seu potencial de forma abrangente. Mensagens instantâneas por meio de software instalado no celular podem ser usadas no lugar do SMS.
Os MEMS buscam proporcionar mais flexibilidade ao paciente no seguimento do tratamento; dar suporte aos pacientes na forma de lembretes e instruções de dosagem e renovação da prescrição; e compilar históricos de dosagem específicos do paciente para viabilizar o aconselhamento e o atendimento diferenciado. A caixa MEMS é um dispositivo eletrônico automatizado que registra e informa o profissional de saúde sobre a regularidade com que a caixa de medicamentos é aberta. Os dispositivos mais antigos registravam o uso no próprio recipiente, mas atualmente os telefones celulares permitem que lembretes e alertas sejam enviados ao cuidador quando as caixas de medicamentos não são abertas em um dia inteiro ou mais. Um grande ensaio clínico randomizado por conglomerados mostrou um efeito estatisticamente significante das caixas MEMS na adesão em comparação com o tratamento padrão; contudo, o efeito sobre o sucesso da conclusão do tratamento foi menos claro (28). Vários avanços tecnológicos relacionados aos MEMS, como a exigência de que os pacientes disquem códigos (para números gratuitos) que são revelados quando as cartelas diárias de medicamentos são abertas, podem ser usados para verificar a adesão. Um protótipo dessa tecnologia que está sendo estudado – 99DOTS (29) – demonstrou taxas de conclusão de tratamento semelhantes às do monitoramento e apoio tradicionais à adesão usados pelos centros, sugerindo que esse tipo de MEMS poderia ser uma alternativa viável a formas mais trabalhosas de monitoramento da adesão aos medicamentos (30). No entanto, é preciso avaliar melhor a viabilidade e a utilidade dessa tecnologia (31).
O tratamento apoiado por vídeo é a forma de tecnologia digital de apoio à adesão que mais se aproxima da interação humana. A crescente disponibilidade de smartphones e tablets com acesso à internet e equipados com software gratuito ou personalizado de comunicação por vídeo expandiu as opções de interação em tempo real (síncrona) e gravada (assíncrona). Estudos observacionais e ensaios clínicos de tratamento da TB apoiado por vídeo em diferentes contextos sugerem que a técnica pode produzir desfechos semelhantes aos do monitoramento presencial e pode aumentar a eficiência (32–35). Considerando os possíveis benefícios do tratamento apoiado por vídeo, são necessários estudos que o avaliem em comparação a diferentes padrões de tratamento, inclusive tratamento autoadministrado e que avaliem a aceitabilidade do tratamento apoiado por vídeo em diferentes subgrupos populacionais e em contextos geográficos com recursos mais limitados.
As vantagens do uso do tratamento apoiado por vídeo são o potencial de oferecer apoio ao tratamento à distância e até mesmo quando a pessoa viaja e não pode fazer consultas nem receber visitas do profissional que apoia o tratamento da TB. O tratamento apoiado por vídeo pode ajudar a alcançar melhores níveis de interação com o paciente a um custo muito mais baixo e com menos inconvenientes em comparação ao apoio presencial ao tratamento. O tratamento apoiado por vídeo pode ser usado de forma complementar ou intercambiável com o apoio presencial ao tratamento ou outras opções de administração de tratamento.
Uma outra opção para prestar cuidados aos pacientes quando for difícil fazer consultas presenciais é agendar consultas para conversar com os pacientes pelo telefone. Dessa forma, é possível responder perguntas sobre o tratamento, monitorar os sintomas e dar orientações. Deve-se tomar cuidado para assegurar que os pacientes encontrem um lugar onde possam conversar com privacidade. Além disso, se o custo para chamada for caro, o tempo necessário para essas conversas pode ser muito dispendioso para o paciente.
O desempenho da tecnologia digital de apoio à adesão em condições de estudo precisa ser traduzido em realidades programáticas. Os profissionais de saúde e os pacientes precisam de auxílios práticos que possam ser adaptados ao período de tratamento do paciente em uma ampla variedade de condições de tratamento e em momentos específicos nos quais a probabilidade de interrupção do tratamento seja mais alta. As tecnologias de apoio à adesão ao tratamento devem fazer parte de uma abordagem integrada que complementa a prestação de cuidados de qualidade. Por exemplo, não é realista nem desejável que os pacientes em um esquema mais longo de tratamento da TB-DR sejam colocados exclusivamente em tratamento apoiado por vídeo por 18 a 20 meses. O risco de interrupção não é uniforme entre os pacientes nem durante o tratamento de um mesmo paciente. Portanto, o apoio ao tratamento precisa ser flexível durante todo o período de tratamento do paciente. Se houver alguma mudança no esquema terapêutico que aumente o risco de reações adversas aos medicamentos, é preciso atenção especial nos seguintes casos: 1) o paciente questiona a necessidade de continuar o tratamento prescrito, pois os sintomas desapareceram e ele se sente melhor; 2) o oposto, o paciente não se sente melhor e acha que o tratamento não vai funcionar; 3) o paciente viaja para um local muito distante do centro de tratamento habitual; ou 4) outros eventos afetam a rotina diária do paciente e dificultam o tratamento diário.
As três abordagens digitais discutidas têm pontos fortes e fracos específicos, que podem fazer com que funcionem melhor em algumas circunstâncias do que em outras. Além disso, o paciente e os profissionais de saúde podem ter preferências diferentes. Com base nas diferentes características de cada uma das tecnologias de apoio à adesão e na situação individual do paciente, diversas opções podem ser adequadas. Duas questões adicionais a serem consideradas são o acesso a smartphones e o acesso à internet de banda larga por meio de assinaturas de telefonia móvel. Devido à sua capacidade de computação e espaço de armazenamento, smartphones e tablets podem ser um recurso valioso para vários aspectos do tratamento da TB. Eles podem ser úteis mesmo que não haja internet de banda larga disponível ou ela seja instável (por exemplo, gravação de tratamento apoiado por vídeo assíncrono, armazenamento de prontuários clínicos e aplicativos de aprendizagem eletrônica). Atualmente, o SMS e o MEMS, que são capazes de funcionar na ausência de cobertura de internet de banda larga móvel, são as formas de apoio ao tratamento mais acessíveis, econômicas e facilmente expansíveis em contextos com recursos limitados. Se a internet móvel for confiável e houver hardware disponível, soluções com mais requisitos de conectividade podem ser consideradas opções.
A crescente variedade de tecnologias disponíveis para apoio ao tratamento ajuda a melhorar o cuidado centrado na totalidade da pessoa. Porém, as tecnologias digitais devem continuar a ser consideradas simples ferramentas e não devem substituir as interações face a face quando elas forem mais adequadas. Outra consideração importante é que as tecnologias digitais de apoio à adesão dependem da observação regular do comportamento da pessoa para que se acompanhe a adesão. Isso traz uma série de questões éticas (7). Algumas tecnologias podem afetar a privacidade do paciente mais do que outras, como o recebimento de uma mensagem de texto diária que solicita uma resposta, o monitoramento automático da abertura da caixa de medicamentos ou uma gravação em vídeo do medicamento sendo ingerido. Os benefícios de obter gravações de pacientes tomando medicamentos e a capacidade de enviar mensagens de texto ou falar com os pacientes devem ser comparados às possíveis desvantagens, como a sensação dos pacientes de que estão sendo controlados, a sensação de estarem sendo monitorados e de não serem confiáveis, a perda de autonomia e as preocupações com a confidencialidade. Essas questões precisam ser amplamente discutidas com os pacientes (consulte a Seção 4.1. sobre Princípios orientadores para educação em saúde e aconselhamento). Outras questões a serem consideradas na determinação da melhor tecnologia de apoio ao tratamento para um determinado paciente incluem sua capacidade e disposição para aprender a usar a tecnologia. A deficiência visual e o nível de letramento podem dificultar o uso correto de telefones celulares pelos pacientes. Outra preocupação é que o custo do tempo de transmissão ou dos dados pode ser muito alto para que os pacientes usem algumas dessas tecnologias. A aceitabilidade e as preferências devem ser exploradas com cada paciente como parte do seu plano de adesão.